Gestão de risco: uma competência essencial

Quando você perguntar a um gestor em qualquer organização como ele ou ela definiria risco, a resposta mais comum será: “a possibilidade de que ocorra um evento que cause perdas humanas ou materiais anormais”. Essa é uma tendência rotineira, associar imediatamente risco a algo negativo. Risco, visto dessa forma, é o prenúncio de um acidente ou de uma ruptura indesejada com o passado. A versão técnica dessa definição é famosa: “risco é a combinação da probabilidade de um evento com sua consequência”.

Entretanto, se pudéssemos, em um passe de mágica, zerar imediatamente o risco de uma organização, com idêntica rapidez cessaria sua criação de valor. Seria a comprovação do dogma dos investidores: quanto maior o risco, maior é a remuneração. Ou ainda: sem risco, sem retorno. Por isso, as definições acima não são equivocadas, mas são incompletas.

De acordo com os padrões internacionais sobre o tema, risco é o efeito da incerteza sobre os objetivos de uma organização. Sendo assim, a essência da Gestão de Risco é apoiar a organização a conviver com a incerteza e não, necessariamente, eliminá-la, até porque o efeito pode ser positivo.

Isso ficou muito claro para mim quando eu era responsável pelo sistema de auditorias internas da Embraer e recebi, em 2004, a incumbência de implantar a área de Gestão de Risco. Você deve estar questionando: pombas, como poderia uma empresa daquele porte, naquele setor de atuação e com aquele histórico brilhante, não ter Gestão de Risco? É óbvio que isso não era verdade: qualquer organização pratica o conceito de Gestão de Risco, da padaria da esquina à megatransnacional, queira ou não queira, já que as incertezas estão sempre presentes. A existência ou não de uma área dedicada é uma opção organizacional. O que a direção da Embraer desejava, naquela ocasião, era estruturar melhor o processo gerencial de Gestão de Risco, de forma que ele ficasse visível e tangível para entidades externas à empresa.

O ser humano aprende a lidar com incertezas desde muito cedo. Qualquer criança pequena entende o conceito de relação custo-benefício, mesmo que ainda não saiba expressá-lo. O projeto da Embraer me evidenciou é que uma coisa é sermos capazes de administrar nosso risco individual e pessoal, outra é uma organização ser capaz de administrar seu risco agregado e coletivo, uma competência que não é adquirida espontaneamente. Ficou muito claro para mim que meu papel não era detectar risco, tal como um cavaleiro solitário, mas lutar para que a empresa adquirisse maiores quantidades dessa competência.

Essa experiência foi muito enriquecedora para alguém como eu, um originário da Qualidade, e abriu-me os olhos para o imenso inter-relacionamento entre as duas disciplinas e delas com a Gestão de Processos. O aprofundamento na Gestão de Risco tornou-me um apóstolo da integração dessas áreas e me fez sonhar com o dia em que usaremos o termo Gestão da Incerteza, que me soa mais apropriado.

Nesse projeto da Embraer e em tantos outros subsequentes de que participei como consultor, aprendi que a Gestão de Risco não tem como missão principal salvaguardar a empresa de eventos desastrosos, até porque é óbvio que isso é inviável – haja vista os inúmeros casos recentes de desatres empresariais nos quais a Gestão de Risco ficou vendida. Quem cuida para que a organização não sofra reveses de grande monta é uma única equipe interfuncional: aquela formada por todas as pessoas da organização, a quem cabe tomar a decisão, dia após dia, de quais riscos podem e devem ser aceitos e de quais riscos queremos estar a uma distância segura.

Ou seja, a missão nobre da Gestão de Risco é “evangélica”: educar as pessoas a lidar com as incertezas, em todos os seus aspectos, provendo a linguagem comum para que isso ocorra naturalmente, de forma compatível à cultura da organização.

Em um mundo em que há novas incertezas surgindo a cada instante, saber como tratá-las é uma competência essencial para qualquer organização e não somente a atribuição de uma área especializada que se esconde sinistramente em um canto do escritório. Em organizações que buscam a excelência, o processo (e não obrigatoriamente a área) de Gestão de Risco estará sempre incorporado aos processos decisórios, ao desenvolvimento de produtos, sistemas e processos da cadeia de valor e a qualquer iniciativa de mudança. Quanto às organizações que não buscam a excelência, bem… desejo-lhes boa sorte, pois vão precisar.

Fonte: http://www.sitecontabil.com.br/noticias/35.html

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